domingo, 25 de maio de 2014

A política e os políticos


Quero refletir sobre a política e os políticos a partir de duas notícias que li no jornal hoje pela manhã. A primeira é sobre o recesso que o Congresso Nacional fará depois da copa do mundo de futebol; a notícia se completa com o fato de que, durante a copa, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal deverão fazer apenas uma sessão semanal  e, a partir de agosto, as campanhas para as eleições de outubro já começam; ou seja, a partir de 12 de junho nossos nobres políticos deverão trabalhar menos do que já fazem. A segunda notícia é sobre o ex-governador do Paraná, Roberto Requião, que, fazendo seus planos para ser candidato ao governo estadual mantém um escritório em Curitiba com mais de 20 pessoas que trabalham praticamente de forma exclusiva para a sua candidatura; a notícia se completa com o óbvio: quem paga o salário dos "funcionários" do seu escritório somos nós, povo brasileiro, pois é o Senado quem paga esta fatura com as verbas de representação. Mas não vou aqui tomar o senador Requião como bode expiatório, pois, na verdade, todos os deputados e senadores têm sua verbas de representação.

Para quem tem algum ideal republicano, como eu, tais notícias causam indignação e levam ao pessimismo. Conseguir se eleger para algum cargo representativo em nível estadual ou nacional é um excelente negócio para quem quer fazer carreira política, para quem quer se tornar político profissional, pois a rotina estabelecida em nossos parlamentos privilegiam o trabalho para a re-eleição ou para a eleição para outro cargo. Tanto o fato de que há muitos dias em que os políticos são desobrigados a comparecer no que deveria ser seu verdadeiro ambiente de trabalho, como o dinheiro que eles recebem para pagar pessoas que vão trabalhar exclusivamente para eles, visando a recondução aos cargos dos seus patrões, são mecanismos que foram naturalizados na política brasileira, e que, é óbvio, eles, os políticos, jamais vão romper. Nós, brasileiros, com parte dos impostos que recolhemos, financiamos a trajetória individual de pessoas que se eternizam na rotatividade de cargos. É o público que financia o particular.

Para quebrarmos com esta perniciosa ciranda defendo, há algum tempo, duas reformas na política brasileira: acabar com a re-eleição para qualquer cargo eletivo e o cumprimento até o final dos mandatos para os quais as pessoas foram eleitas. Sem possibilidade de recondução aos cargos, especialmente os legislativos, talvez os políticos trabalhem exclusivamente para os mandatos para os quais foram eleitos e as pessoas a serem contratadas para seus escritórios passariam a ser uma extensão de um serviço público e não de uma agência particular. Cumprir os mandatos até o final, proibindo-se a candidatura para qualquer cargo enquanto sua gestão não terminar, talvez, também, faça da agenda dos políticos o presente de todos e não o futuro deles próprios, esforçando-se para cumprir, de fato, o programa de governo que foi aprovado pelas urnas.

Meus leitores podem me chamar de utópico, para o que serei forçado a concordar. Quando o que se propõe se parece com uma utopia é inevitável que o pessimismo se aproxime de forma contundente, no entanto, se não cultivarmos utopias corremos o risco de enfiar nossa indignação terra a baixo e deixar que o publico continue sendo um terreno para, inclusive, locupletagens particulares.  Termino esta postagem com uma parte do discurso pronunciado em 1848 por Alexis de Tocqueville na Câmara dos Deputados da França, o qual, apesar da distância do tempo e do espaço, ainda me parece, tragicamente, atual:

"Temo, senhores, que atribuindo o mal que se confessa às causas que se indicam, não se está levando em conta a enfermidade, mas o sintomas. Por mim, estou convencido de que a enfermidade não se acha ali; é mais geral e mais profunda. Essa enfermidade, que é preciso curar a todo preço e que, podeis bem crê-lo, nos levará a todos, ouvi bem que digo todos, se não nos cuidarmos disso, é o estado em que se encontram o espírito público, os costumes públicos. Eis onde se acha a enfermidade; é para este ponto que desejo chamar vossa atenção. Creio que os costumes públicos, o espírito público, acham-se num estado perigoso; creio, mais, que o governo [classe política] contribuiu e contribui da maneira mais grave para aumentar este perigo."