terça-feira, 27 de novembro de 2018

A pressão do PAS sobre nossos estudantes


Se não me engano, o Processo de Avaliação Seriada (PAS) da Universidade Estadual de Maringá (UEM) foi criado em 2008 ou 2009. Eu era, à época, pró-reitor de graduação da UEM quando as discussões tiveram início com a gestão da reitoria de 2006/2010. A ideia, em princípio, me parecia interessante e dei meu apoio, pois vislumbrava-se baixar a pressão do vestibular e estender o processo de entrada na universidade ao longo dos três anos do ensino médio, em que os candidatos não escolheriam o curso de início e, depois, com a soma da pontuação das provas iriam escolher, caso tivessem sucesso na seleção, o curso que iriam fazer. Enfim, a ideia era suavizar o disputado processo de ingressar na UEM. No entanto, com o passar do tempo, o que se verifica, na minha opinião, é que o PAS/UEM resultou num efeito exatamente o contrário: ele é responsável hoje pelo aumento exponencial da pressão sobre os estudantes do ensino médio.

Só fui me dar conta do efeito contrário do PAS/UEM quando minha filha, a Sofia, entrou para o ensino médio neste ano. Aliás, tem coisas na vida que só nos damos conta de verdade, só vemos seus reais efeitos, quando nos envolvemos diretamente. Hoje, alunos do ensino médio têm, na prática, pelo menos três vestibulares ao invés de um. Quem, não sendo professor e nem aluno diretamente interessados, já teve a curiosidade de ler a prova do PAS para ter a noção do que se cobra e da forma como se cobra (questões somatórias), verá que o que se exige é um conteúdo para além do que o estudante médio, normal, está acostumado. O nível de complexidade da prova da primeira fase (que corresponde ao primeiro ano do ensino médio) desse vestibular chamado, eufemisticamente, de processo de avaliação seriada, é muito alto, exigindo, dos alunos, uma dedicação que está muito além do comparecimento deles em sala de aula e do estudo para as provas regulares. Portanto, o nível de pressão aumenta muito pelos resultados que se espera.

Duas outras coisas que acontecem como repercussão do PAS e que aumenta a pressão sobre os alunos: a expectativa dos pais e a competição entre as escolas. Sobre o primeiro aspecto não há novidade, a não ser o fato de que a pressão resultante da expectativa dos pais para a entrada de seus filhos em cursos concorridos, como, por exemplo, medicina, arquitetura e direito,  no mínimo triplica, e os alunos que têm esse tipo de "motivação" passam a se exigir muito, muito mais... Sobre os colégios, especialmente entre os particulares, criou-se cursinhos preparatórios para o PAS, as provas das disciplinas, em grande parte, já são aplicadas com o formato somatório e, especialmente, dirige-se as disciplinas para o vestibular seriado. Como estamos numa sociedade capitalista, em que a educação também é uma mercadoria (aliás, valiosa!!), a competição entre os colégios começa pelo marketing de quantos alunos seus foram aprovados pelo PAS/UEM, o que, na prática, aumenta o valor da mercadoria que o colégio vende. Os colégios fazem este tipo de propaganda justamente porque acreditam (e devem estar certos!) que os pais matriculam os filhos naqueles colégios que conseguem mais aprovar seus alunos nos exames de ingresso para as universidades. Ou seja, na prática, tudo no colégio passa girar em torno do PAS, que aliado, ou decorrente, da expectativa dos pais, aumenta, como escrevi acima, de forma exponencial a pressão sobre nossos jovens. Os colégios públicos, por não terem necessidade de concorrer no mercado educacional, não têm cursinhos preparatórios, mas, com certeza, seus alunos já sentem também a pressão desde o primeiro ano do ensino médio.

As estatísticas mostram que, infelizmente, nossos jovens estão atentando contra a vida de forma alarmante. A pressão que eles têm na vida, pressão de várias origens, faz com que muitos se sintam incapazes de responder e ficam doentes. O período da vida que vai dos 14 aos 17 anos nunca foi fácil, pois é um período de crises, de amadurecimento e de, aos poucos, decidir o que vai fazer em sua vida de adulto. Mas, por outro lado, sempre foi um período de descobertas, do lúdico, de uma certa tranquilidade na vida para aqueles que não tinham que ir para o mercado de trabalho precocemente. O ensino médio que deveria, na minha opinião, focar na aprendizagem útil para a vida concreta de nossos alunos, fazer com que eles se interessassem, por si só, pelos conteúdos das disciplinas com liberdade e fossem amadurecendo aquilo que a gente chama de "vocação", agora insere-os num ambiente de pressão precoce.

Confesso que me me culpo de não ter pensado à poca em que discutíamos o PAS na UEM nas consequências que hoje, na nossa sociedade capitalista e competitiva, me parecem óbvias. Quem sabe eu poderia ter interferido ou problematizado mais a inciativa, Aquilo que eu achava que aliviaria a pressão sobre os alunos só fez aumentá-la. E, neste mundo com cada vez mais motivos para adoecer, os nossos jovens não deveriam ter mais um mecanismo, que se torna quase cruel, de pressão.