segunda-feira, 22 de outubro de 2018

Eu votaria no Bolsonaro se...






Eu votaria no Bolsonaro se:






- eu achasse que o Brasil precisa de um Salvador da Pátria para resolver os seus problemas;
- eu não concordasse com um Estado laico em que a religião deve ser prática individual ou coletiva em igrejas e não um projeto político para um país;
- eu achasse que para o bem público, num regime democrático e republicano, deve-se colocar Deus acima de tudo e de todos;
- eu acreditasse que existe uma única concepção de Deus; pois, como há várias e diferentes "versões" de Deus, quem adquire poder são aqueles que se julgam o intérprete do Deus verdadeiro. Ou seja, num Estado Laico, que deve respeitar a diversidade religiosa em seu território e não deve censurar nenhuma religião, colocar Deus acima de tudo e de todos pode acarretar uma sociedade baseada em uma única interpretação de quem é Deus e do que ele quer de nós;
- eu não concordasse com uma sociedade plural, em que a crítica faz parte do cotidiano de nossas vidas;
- eu acreditasse que para ser presidente bastam bravatas e basta incitar o medo da população para com o seu concorrente direto;
- eu acreditasse que não é necessário expor concretamente quais as propostas que se tem para solucionar os problemas do Brasil;
- eu aceitasse que uma campanha no rádio e televisão deveria ser feita apenas nas críticas ao adversário; afinal, é preciso saber quais as propostas para acabar com a violência, para aumentar o número de empregos, para retomar a economia, para melhorar a educação e a saúde pública, para resolver o problema da dívida pública, da previdência etc.;
- eu acreditasse que apenas a qualidade da honestidade fosse suficiente para o cargo público de maior poder e responsabilidade do Brasil, pois, se assim o fosse, não precisaríamos de eleição, mas de um concurso público para descobrir a pessoa mais honesta do Brasil;
- eu acreditasse que fosse normal uma pessoa que passou 27 anos de sua vida em cargo público de relevância no Brasil não ter apresentado nada de relevante e nunca ter querido passar pela experiência de um cargo executivo, para o qual, aliás, está  se candidatando;
- eu considerasse que não é necessário participar de debates com o adversário para expor para a nação  as propostas e mostrar porque sua candidatura é melhor que a outra; o debate faz parte da essência da democracia, ainda mais quando se está num segundo turno em que restam apenas dois dos candidatos;
- eu acreditasse que o período militar de 1964 a 1985 trouxe realmente estabilidade para o Brasil, que naquele período não houve corrupção e que as pessoas tinham liberdade para se organizar e criticar o governo;
- eu achasse que a corrupção no Brasil é uma prática de dois ou três partidos e não algo praticamente endêmico na política brasileira; partidos pequenos, como o PLS em eleições anteriores, foram "alugados" por partidos grandes, recebendo dinheiro para servir de "aríetes políticos"; aliás, Bolsonaro foi filiado a 9 partidos, a maioria deles sem nenhuma relevância ou expressão política para o Brasil;
- partilhasse dos preconceitos de gênero, raça e sexo;
- acreditasse que a família tradicional brasileira não está cheia de hipocrisia, de submissão da mulher, de dupla jornada de trabalho da mulher e de homens que vão à igreja em um dia e ao puteiro no outro;
- enfim, eu não quisesse que minha filha vivesse num país com liberdade, com respeito, com valorização das diferenças e com esperança num futuro melhor.

No entanto, quero aqui deixar claro que meu voto em Haddad, neste momento, é porque vejo nele alguém que vai, pelo menos, andar pelos caminhos da democracia e do republicanismo e, com ele, não corremos o risco da instalação de um conservadorismo moral persecutório no Brasil. Como diz um amigo meu, prefiro votar alguém que pode, futuramente, ser acusado de ladrão, porque se assim o fizer podemos prendê-lo, do que votar em alguém que pode, futuramente, tornar-se um ditador, pois aí é ele que pode me prender simplesmente pelo fato de eu criticá-lo.
Mas, com toda a sinceridade, não gostaria de estar entre essas duas opções, por isso votei no Ciro no primeiro turno. O PT ainda deve ao Brasil um reconhecimento de que a corrupção atuou em parte do seu esquema partidário. O PT deve parar de endeusar o Lula como, também, uma espécie de salvador da pátria. O PT deve, a meu ver, deixar uma arrogância de que é a melhor opção de esquerda e de governo e deve dialogar, em pé de igualdade, com todas as forças republicanas neste nosso país.
Torço pela vitória de Haddad, mas torço também que ele possa fazer, de fato, um expurgo no PT e que ele seja cabeça de um projeto de governo e não de um projeto de poder.



quarta-feira, 3 de outubro de 2018

E se as eleições de hoje fossem há 100 anos atrás?


Estes dias estão sendo de muita reflexão sobre a atual conjuntura política brasileira. Procuro entender a quantidade expressiva de votos que o candidato Bolsonaro deverá ter no próximo dia 07 de outubro. Procuro entender as motivações de pessoas esclarecidas, estudadas, em optar por um salvador da pátria como o próximo presidente do Brasil.

Creio que há duas grandes frentes  de votos para ele (que podem ser subdivididas em outras, mas não vou fazer este exercício aqui) a primeira, mais fiel, de uma parcela declaradamente conservada em termos morais, que vêem em Bolsonaro, por ser abertamente contra a ideologia de gênero, ser abertamente homofóbico e machista, um defensor dos valores supostamente perdidos da família brasileira. O conservadorismo existe e sempre existiu na história da humanidade, pois diante de novidades das gerações mais novas, a geração anterior normalmente atribui a isto um desvio perigoso do desejado  comportamento humano, especialmente dos mais jovens; além disso, a religião sempre é usada como justificativa para que não haja mudanças que coloquem em xeque aquilo que, segundo os lideres das igrejas, Deus quer de nós.  Outra parcela reune em sua grande maioria o movimento antipetista, com um discurso contra a corrupção. No entanto, este segundo grupo é composto, também, pelas pessoas que se deludiriam com a política e que, diante de um vazio gerado pela ausência da polarização PSDB x PT, optam por um candidato supostamente novo e, também, supostamente não atrelado à corrupção política brasileira. Diante deste quadro, no entanto,  estou fazendo, por esses dias, um exercício mental-imaginativo-fantasioso que talvez contribua para pensarmos, efetivamente, o que seria um possível governo do Bolsonaro no Brasil: imaginemos  se as eleições deste ano fossem há 100 anos atrás e se o Bolsonaro fosse candidato?

No início do século XX o Brasil vivia um momento de entrada na era republicana e muitos líderes advogavam a necessidade de formar um cidadão que contribuísse para que o Brasil se desenvolvesse e se tornasse social, econômica e politicamente tão grande quanto o seu território. Nesse movimento tivemos importantes avanços sociais que repercutem até hoje. Avanços que foram conseguidos mediante muita luta e, especialmente, em lideranças políticas que assumiram bandeiras sociais importantes e colocaram parte de seus mandatos a serviço do enfrentamento do conservadorismo. Vejamos, hipoteticamente (mas, sem sombra de dúvida, bastante real), naquele quadro social, uma plataforma política do candidato Bolsonaro do passado:

- pelo restabelecimento da escravidão no Brasil, pois os negros, sendo uma raça inferior, não têm como arranjar empregos decentes e só vão fazer aumentar a pobreza e a violência no Brasil;
- pela manutenção do voto para aqueles que possuem propriedades, pois as pessoas comuns, destituídas de boa educação, não podem influenciar no futuro do país;
- pela manutenção dos votos somente para homens, pois o lugar das mulheres, por sua constituição física, é o lar, cuidando dos seus filhos e maridos, e, por isso, elas não tem maturidade racional para exercer o seríssimo direito ao voto;
- pela redução das áreas destinadas aos índios, pois eles não precisam de grandes áreas para viver, pois, além de preguiçosos, eles são indolentes e as áreas destinadas a eles devem ser repassadas para os nossos capitalistas agrários para produzirem os alimentos para os brasileiros;
- pela tipicação  do homossexualismo como crime contra a humanidade e a religião, pois subverte, demoníacamente, a sagrada família brasileira, pois Deus, em sua infinita sabedoria, criou o homem e a mulher somente. Os crimes de homossexualismo devem ser punidos com a prisão e a castração química e, na reincidência, com a morte;
- pena de morte para todos os criminosos, independente se forem simples ladrões ou assassinos. Os policiais estarão liberados para primeiro atirar e depois perguntar;
- pelo retorno imediato do Brasil cristão, devendo ser proibida qualquer religião que contrarie os dogmas da Santa Madre Igreja.

O que nos parece hoje este tipo de plataforma política? Horrível, atrasada, perniciosa, criminosa?? Sim, tudo isto e muito mais... mas, atualizando o discurso do Bolsonaro e sua plataforma política hoje, não seria a mesma coisa?? O Brasil se tornou democrata e republicano enfrentando os discursos acima, pois sempre teve gente (as vezes menos, as vezes mais) que defenderam todos aqueles pontos e outros mais, numa atitude conservadora e reacionária diante do que acreditavam ser pernicioso para a família, para a religião e para o país. Imagine se "ele" tivessem vencido? Mulheres, negros, índios, homossexuais, democracia, espírito republicano, liberdade religiosa... todos os avanços não teriam acontecido...

E agora a pergunta fatal: o que será se o Bolsonaro ganhar agora??

PS: sou a favor de qualquer opinião sobre qualquer coisa; acho que a democracia pressupõe que a ninguém deva ser cercado seu direito a expressar-se. Portanto, não tenho nenhum problema com as opinões conservadoras, pois o conservadorismo sempre fez e sempre fará parte da sociedade; meu problema é quando o conservadorismo se torna projeto político que coloca em risco os avanços sociais que foram conseguidos a duras penas...