domingo, 14 de abril de 2013

Novelas


As primeiras novelas que lembro ter assistido a alguns capítulos foram Irmãos Coragem, em 1971, e Selva de Pedra, em 1972.  Depois vieram O Bem-Amado (1973), Pecado Capital (1975), Saramandaia e Estúpido Cupido (1976), Dancin' Days (1978), Água Viva (1980),  Roque Santeiro (1985), Brega & Chique (1987), Vale Tudo (1988), Que Rei Sou Eu (1989), O Dono do Mundo (1991), Pedra sobre Pedra (1992), Renascer (1993), O Rei do Gado (1996),  O Cravo e a Rosa (2000), Chocolate com Pimenta (2003), A Favorita (2008), Fina Estampa (2011) e Avenida Brasil (2012), apenas para citar algumas das muito mais novelas que acompanhei. Sim, gosto, e muito, de novelas!!

Às vezes me pergunto as razões pelas quais acompanho as novelas, já que desde jovem passei a adquirir (acho) um senso crítico da realidade e prestar atenção às ideologias que estão a nossa volta. A TV, como sabemos, é um dos principais veículos da ideologia burguesa consumista, além de propagandear os interesses daqueles que detêm o capital. No entanto, apesar de continuar me achando crítico, continuei com meu entretenimento sem, inclusive, ter peso na consciência... Bem, eu nasci em 1966 e a TV nasceu no Brasil em 1950, sendo que em 1972 ela se popularizou definitivamente quando passou a transmitir os programas em cores. A minha geração, portanto, foi a primeira que cresceu com a televisão, assim como as atuais gerações cresceram com o computador. E, com isso, aquele aparelho televisivo fez parte da minha formação, especialmente no que diz respeito a um dos momentos de puro divertimento (um dos muitos, diga-se de passagem). Da mesma forma que assistia às novelas, eu acompanhei todos os desenhos e os seriados, especialmente os de ficção científica.

No entanto, meu gosto pelas novelas não passa somente pelo divertimento, pois aprendi vê-las, também, como produtos da sociedade que a expressam de forma muito particular. Desde muito tempo eu defendo a idéia (como já escrevi aqui no blog, no post "Gibis, Televisão, Infância e Violência?") que a televisão, como mercadoria que é, não pode correr o risco de colocar no mercado um produto novo sem ter sido testado na sociedade e, portanto, mais do que veicular coisas novas e maléficas para a família brasileira, ela só faz ampliar para o grande público, aquilo que já está sendo praticado no social. Se uma novela passar a veicular, por exemplo, a defesa do aborto, ela só o fará porque setores importantes da sociedade também estão fazendo, ou seja, o papel que muitos imputam à TV de ser vanguarda em termos de comportamento é um grande mito, pois, na minha visão, de vanguarda ela não tem nada, justamente porque ela custa muito para se perder dinheiro com algo que pode não dar certo. A sociedade, ou mais precisamente setores e movimentos sociais é que são vanguarda...

A novela é um retrato da sociedade. Os enredos, cômicos ou dramáticos, mostram a sociedade e, quanto melhor o fizerem, melhores são as novelas. Mesmo aquelas que desenvolvem quase que uma ficção, como Fera Ferida (1994), a história é feita de relações humanas que se estabelecem, se rompem, se unem, se vingam, se divertem, se decidem, se vivem e se morrem. As virtudes e os vícios que são mostrados, geralmente de forma potencializada e radical, são os mesmos da sociedade. E, como dizem respeito à nós mesmos, ficamos torcendo para que, pelo menos no mundo da ficção televisiva, os mocinhos se dêem bem e os malvados se dêem mal. São poucas as novelas, como Vale Tudo, que teve um final inesperado, aonde parte dos malvados se deram bem. Quando se segue o esperado, o final é uma espécie de catarse para os tele-espectadores; afinal, queríamos ou não que a Carminha (Avenida Brasil) pagasse pelas suas maldades?

Como retratos da sociedade, as novelas acabaram se tornando para mim um manancial de exemplos para minhas aulas e para minha vida. E, no caso das novelas da Globo, são produções muito bem feitas, com ótimos autores, atores, diretores etc. Inúmeras cenas e personagens, com os quais eu acabei convivendo por um tempo, me ajudam a entender e a refletir sobre a sociedade. De resto, para não cair no engodo de que as coisas na vida se resolvem como nas novelas, fico pensando quantas figuras poderosas hoje em dia que continuam dando uma "banana"* para o Brasil!!

(*) Para quem não lembra, numa das cenas finais de Vale Tudo o personagem de Reginaldo Faria (Marco Aurélio), um dos malvados da história, dá uma "banana" (um gesto com o braço que representa algo como "vá se danar") para o Brasil a bordo do seu jatinho quando fugia para o exterior.


domingo, 7 de abril de 2013

padronização, mesmice e massificação



Recentemente resolvi assumir definitivamente minha parte no conflito de gerações. Fui a uma formatura  e não consegui passar da sexta música que a banda estava tocando. Apesar do ótimo jantar, da companhia agradável, das pessoas bonitas e elegantes, especialmente as formandas, quando o "baile" de fato começou a realidade me chocou como uma pedra na testa, pois, me desculpe quem gosta, mas esta onda do sertanejo universitário é difícil de suportar. A mesmice das letras é de uma pobreza poética chocante. Mas, como tenho a mania de ficar pensando a respeito das coisas da atualidade e me perguntar a razão delas, me ocorreu que uma das mudanças ocorridas nas festas em geral de hoje em dia em relação a um passado recente, é a padronização das músicas.

Como eu acho muito chato falar coisas como "no meu tempo as coisas eram assim" e "antigamente era assim", vou usar aqui uma espécie de eufemismo: há pouco tempo, quando da minha juventude, haviam três tipos de festas com músicas diferentes, as quais marcavam a distinção das festas: o carnaval, os bailes de formatura e as baladas em geral. No carnaval o que era característico eram as marchinhas e os sambas-enredo, em cujos bailes o que predominava era dançar solto e "pular" o carnaval; nos bailes de formatura havia uma mistura de ritmos, mas havia espaço para samba e para bolero, ritmos em que o casal dança junto; nas baladas, mais recentemente, se escutava e se dançava axé, sertanejo, música gaúcha, rock etc. Ultimamente, o que se observa é que independente do tipo do baile, são as mesmas músicas que predominam: o sertanejo universitário, o axé e o funk. 

Fico me perguntando quais as razões de tal padronização musical? Por que há uma mesmice nos momentos de festa da moçada hoje em dia? O que significa tal massificação de tão poucos estilos (?) musicais, especialmente do sertanejo universitário? A única resposta que encontro, pelo menos por ora, é que as festas expressam uma dinâmica social em que os comportamentos, os gostos, a moda tornaram-se padronizados, impulsionados por uma outra dinâmica que é a do consumismo. O consumo desenfreado é determinado pelo mecanismo da carência, a qual, uma vez instalada, cria uma necessidade de supri-la para ter a sensação do prazer. Tal mecanismo é facilitado quando há uma espécie de homogeneização das carências e, portanto, das necessidades. 

A música, numa sociedade de consumo, é uma mercadoria como qualquer outra, e, portanto, o investimento da propaganda musical é criar uma espécie de linha de consumo única, por meio da simplificação das letras, da padronização dos ritmos, numa espécie de  massificação de um produto. Para que a música seja bem consumida, as letras não são muito elaboradas, gerando uma identificação quase que imediata da vida do ouvinte com a história contada na música. Seja cantar a perda de um amor, a conquista de outro, a vingança da traição, a curtição da vida, por meio do prazer e do sexo, as letras dizem respeito, geralmente sem qualquer grande elaboração, à vida do sujeito, também vivida sem grandes elaborações. Num mundo em que somos cada mais impelidos a nos sentir cada vez mais carentes, as festas se tornam quase que essenciais para conhecermos pessoas, nos relacionarmos e, é claro, acharmos parceiros, e, como tempero nada melhor do que a música. 

Claro que existem festas, baladas, bares em que o jazz, blues, rock, MPB ainda tocam. Ainda bem, diga-se de passagem!! Mas, me parece que são eventos menos procurados, frequentados quase que por guetos. A maioria está em outra "vibe"; a maioria é levada, quase que imperceptivelmente, a consumir um produto fácil, barato, emotivo e renovado constatemente (quantas duplas sertanejas existem mesmo??). De minha parte, como escrevi no começo, assumo minha parte no conflito de gerações, pois a última vez que fui a um "baile" de carnaval tive que sair bem antes do final, quando a banda tocou uma moda sertaneja...