Recentemente resolvi
assumir definitivamente minha parte no conflito de gerações. Fui a uma
formatura e não consegui passar da sexta música que a banda estava
tocando. Apesar do ótimo jantar, da companhia agradável, das pessoas
bonitas e elegantes, especialmente as formandas, quando o "baile" de
fato começou a realidade me chocou como uma pedra na testa, pois, me desculpe
quem gosta, mas esta onda do sertanejo universitário é difícil de suportar. A
mesmice das letras é de uma pobreza poética chocante. Mas, como tenho a mania
de ficar pensando a respeito das coisas da atualidade e me perguntar a razão
delas, me ocorreu que uma das mudanças ocorridas nas festas em geral de hoje em
dia em relação a um passado recente, é a padronização das músicas.
Como eu acho muito chato
falar coisas como "no meu tempo as coisas eram assim" e
"antigamente era assim", vou usar aqui uma espécie de eufemismo: há
pouco tempo, quando da minha juventude, haviam três tipos de festas com músicas
diferentes, as quais marcavam a distinção das festas: o carnaval, os bailes de
formatura e as baladas em geral. No carnaval o que era característico eram as
marchinhas e os sambas-enredo, em cujos bailes o que predominava era dançar
solto e "pular" o carnaval; nos bailes de formatura havia uma mistura
de ritmos, mas havia espaço para samba e para bolero, ritmos em que o casal
dança junto; nas baladas, mais recentemente, se escutava e se dançava axé,
sertanejo, música gaúcha, rock etc. Ultimamente, o que se observa é que
independente do tipo do baile, são as mesmas músicas que predominam: o
sertanejo universitário, o axé e o funk.
Fico me perguntando quais
as razões de tal padronização musical? Por que há uma mesmice nos momentos de
festa da moçada hoje em dia? O que significa tal massificação de tão poucos
estilos (?) musicais, especialmente do sertanejo universitário? A única
resposta que encontro, pelo menos por ora, é que as festas expressam uma
dinâmica social em que os comportamentos, os gostos, a moda tornaram-se
padronizados, impulsionados por uma outra dinâmica que é a do consumismo. O
consumo desenfreado é determinado pelo mecanismo da carência, a qual, uma vez
instalada, cria uma necessidade de supri-la para ter a sensação do prazer. Tal mecanismo
é facilitado quando há uma espécie de homogeneização das carências e, portanto,
das necessidades.
A música, numa sociedade de
consumo, é uma mercadoria como qualquer outra, e, portanto, o investimento da
propaganda musical é criar uma espécie de linha de consumo única, por meio da
simplificação das letras, da padronização dos ritmos, numa espécie de
massificação de um produto. Para que a música seja bem consumida, as
letras não são muito elaboradas, gerando uma identificação quase que imediata da
vida do ouvinte com a história contada na música. Seja cantar a perda de um
amor, a conquista de outro, a vingança da traição, a curtição da vida, por meio
do prazer e do sexo, as letras dizem respeito, geralmente sem qualquer grande
elaboração, à vida do sujeito, também vivida sem grandes elaborações. Num mundo
em que somos cada mais impelidos a nos sentir cada vez mais carentes, as festas
se tornam quase que essenciais para conhecermos pessoas, nos relacionarmos e, é
claro, acharmos parceiros, e, como tempero nada melhor do que a música.
Claro que existem festas,
baladas, bares em que o jazz, blues, rock, MPB ainda tocam. Ainda bem, diga-se
de passagem!! Mas, me parece que são eventos menos procurados, frequentados
quase que por guetos. A maioria está em outra "vibe"; a maioria é
levada, quase que imperceptivelmente, a consumir um produto fácil, barato,
emotivo e renovado constatemente (quantas duplas sertanejas existem mesmo??).
De minha parte, como escrevi no começo, assumo minha parte no conflito de
gerações, pois a última vez que fui a um "baile" de carnaval tive que
sair bem antes do final, quando a banda tocou uma moda sertaneja...
Concordo com as ideias e partilho dos sentimentos. Mas fico angustiado em saber qual a minha parcela de culpa neste processo? Em que momento a sociedade se perdeu nesta lógica do consumo e como tantas pessoas permitem e aceitam isto com naturalidade e conformismo.
ResponderExcluirMarcos Dorigão