sábado, 26 de janeiro de 2013

Terapia


Fazer terapia não é fácil. Enganam-se aqueles que acham que terapia é coisa simples, que é ficar jogando conversa fora, que é uma forma de fugir dos verdadeiros problemas. Enganam-se, também, aqueles que acham que terapia é somente para casos específicos de algum tipo de transtorno patológico visível. Quem deve procurar os recursos psicoterapêuticos são aqueles que sentem que precisam de ajuda de um profissional que tem recursos para conduzir um (geralmente longo) processo de autoconhecimento. Pronto, eu defino terapia como um processo de conhecimento de si mesmo. Estas conclusões partem de alguém (eu!) que não é psicólogo, portanto, não tem nem a teoria e nem a prática de ser terapeuta, mas que faz terapia a um ano e meio. Portanto, são impressões de um paciente...

Ao contrário do que eu pensava, a terapia parece que não segue um percurso em que as sessões se sucedem numa lógica como capítulos de uma novela, em que o assunto anterior é necessariamente retomado na sessão seguinte para, com o tempo, ir "zerando" os aspectos investigados. A terapia é não-linear, e isso, depois de uma impressão desconfortável no começo, me atraiu muito, pois defendo a idéia de que a vida não é linear. Cada novo encontro com o terapeuta é realmente novo, pois o ponto de partida para o diálogo é o que o paciente leva naquele dia: impressões, chateações, pequenas vitórias, desilusões, sonhos (literalmente) etc., que vão sendo trabalhados na perspectiva do que podem revelar acerca daquilo que está recôndito, daquilo que está nebuloso na inconsciência do paciente.

O processo terapêutico ocorre em meio ao diálogo, sem que haja a necessidade de enquadrar neste ou naquele conceito. É claro que o terapeuta tem a teoria para analisar e, se for o caso, "enquadrar" aspectos da vida do paciente, até para que se vá fundo nas causas de certos comportamentos, mas, os conceitos não são antepostos ao diálogo. Lembro que, como professor, defendo, também, que os conceitos não devem vir antes dos autores estudados, para se evitar enquadrar antecipadamente o pensamento em rótulos desprovidos de vida.  Falando nela, a vida é o objeto de estudo em questão na terapia; a vida do paciente, sua história, especialmente na infância, que revelará as causas de certas opções feitas e de certos comportamentos adquiridos. O processo terapêutico, se bem conduzido e aceito pelo paciente, conduzirá a uma re-elaboração da sua história e, para fazê-lo, o que importa é a disposição para algo muito difícil, conhecer a si próprio, ou para usar uma metáfora bem apropriada aqui, mirar-se no espelho da alma. Talvez por isso os gregos consagraram em seus templos a frase que acabou sendo atribuída a Sócrates: "conhece-te a ti mesmo", como o primeiro passo para se atingir a verdadeira sabedoria.

Apesar do poeta Caetano Veloso ter dito que "de perto, ninguém é normal" (Vaca Profana), o que faz muito sentido, discordo do que muitos falam de que todos nós deveríamos fazer terapia, pois acho que isso é banalizar os seus efeitos, no entanto, pelo que verificamos nestes tempos (anos 10!!) em que as pessoas não conseguem trabalhar e aceitar os lutos, as frustrações, as cobranças, os "nãos" na vida pessoal e profissional, temo que a terapia acabe sendo, em poucos anos, uma política pública para a saúde da população. Quando, por exemplo, se mata por R$7,00 ou por R2,50, como vimos nos noticiários nas últimas semanas, alguma coisa de muito profundo está vindo à tona no convívio social. Há que se ter remédio para isso!!!!


5 comentários:

  1. Célio,

    Talvez seu melhor post até agora. Texto maduro e focado.

    Parabéns!

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. é isso aí Celio!
    Como é importante, em tempos desalmados, nos abrirmos para as perspectivas da alma!
    abraço
    Celorio

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  4. Ótimo texto. Concordo com você, o processo de terapia é, no fundo, um conhecer a ti mesmo e se aproximar da verdadeira pessoa, sem as máscaras que usamos.

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  5. Bom dia !
    na minha opinião, o uso da palavra máscara é insuficiente para expressar alguns comportamentos e atitudes da vida adulta, sobretudo nessa sociedade que exige muito de nós.
    Penso que efemeridade da vida atual retira de nós a possibilidade de refletirmos sobre o que realmente somos e, ao mesmo tempo, vamos cedendo lugar para o que a sociedade espera de nós.
    Se não bastasse toda a nossa história de vida que faz de nós o que somos hoje, temos ainda uma sociedade que nos cobra insessantemente atitudes, ações e comportamentos que não refletem a nossa essência. Essa tensão e cobrança se estende desde as relações pessoais até as relações profissionais.E isso não é pouco.
    Por fim, eu não sei se todos deveriam fazer terapia, mas eu acredito que todos mereciam, de alguma maneira, minimizar as dores da alma

    Kriska.

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