domingo, 30 de março de 2014

Estupro, ciúme e indignação


Assim como muita gente, como meus amigos, fiquei espantado com o resultado da recente pesquisa divulgada nos meios de comunicação social sobre o estupro no Brasil. O que mais impressionou foi, é claro, o alto número de pessoas, homens e mulheres, que culpam as mulheres pelos estupros. Confesso que não imaginava uma coisas dessas. Mas não vou repetir aqui o que muita gente já fez, se opondo às pessoas que culpabilizam as vítimas ao invés dos criminosos, pois considero que as reações, com as quais concordo plenamente, já mostram o quanto temos que caminhar ainda na direção da dignidade humana.

Quero refletir aqui sobre algo que em meu modo de entender está por detrás das opiniões que jogam a culpa nas mulheres, em suas roupas, em seus jeitos, em suas liberdades, pela ação dos estupradores. Me parece que uma das características da sociedade atual é jogar a responsabilidade dos próprios atos nas atitudes dos outros. É o caso do ciúme, quando uma pessoa se apossa da outra e passa a viver em sua função, fica dependente de tal forma que passa a vigiar os passos e pensamentos do outro e, com isso, passa a culpar a pessoa amada pela sua infelicidade; ou seja, a causa da felicidade/infelicidade deixa de ser a pessoa em si, e sim a projeção que ela faz para a outra. Daí, a culpa de todas as coisas erradas desloca-se para fora de si. Esta lógica me parece que se encontra, também, nas concepções que jogam a culpa dos estupros nas mulheres. Só assim eu consigo entender porque mulheres, na pesquisa, também responderam que as culpadas pelos estupros são as próprias vítimas.

O estupro, como a pedofilia, são derivados de doenças mentais que não têm cura. O prazer do estuprador não é o sexo em si, mas o sexo não consentido, que passa a ser um meio de se ter um pleno poder sobre outra pessoa. É um exercício cruel de poder. Estupradores e pedófilos têm que ficar isolados da sociedade, pois não adianta, em minha opinião, prendê-los por um tempo e soltá-los depois de 10, 20 ou 30 anos, pois eles voltarão a agir. Portanto, não é a roupa e sim a ocasião que leva um estuprador a agir, é a ocasião que leva um estuprador a se impor pela fragilidade da vítima e desgraçar uma vida. Jogar a culpa de tal ato na vítima é estuprá-la outra vez, de forma psicológica e igualmente nefanda. Jogar a culpa na vítima é jogar a responsabilidade no outro; arrisco a dizer que, inclusive, se trata de uma forma que homens e mulheres têm de manifestar o ciúme e inveja que têm de mulheres que têm a coragem de se vestir e se comportar fora dos padrões conservadores que a sociedade exige.

O mesmo mecanismo que gera o ciúme doentio, tão típico da nossa atual sociedade, gera, em minha opinião, a pessoa a achar que a vítima de estupro é culpada do crime que a ela foi cometido. O ciúme é tido, errada e infelizmente, como sinônimo de amor... e a culpabilização da vítima do estupro é o que? Uma forma disfarçada de amar o criminoso???


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