Me proponho aqui a apresentar algumas reflexões sobre o contexto atual que envolve a realização da Copa do Mundo da Fifa no Brasil. Conversando com amigos, creio que é necessário se posicionar sobre a realização da copa aqui em terras tupiniquins, pois para fazer isto é necessário pensar sobre outros pontos que acabam por ser correlatos. Adianto que sou favorável a que o Brasil promova o principal evento esportivo do planeta. Mas, inegavelmente, a sua realização expõe uma fratura no tecido social brasileiro que pode ter consequências complicadas para nosso país.O que ocorre hoje não me parece diferente do que ocorreu na década de 1970, especialmente no início, quando o Brasil, em meio ao regime militar, conquistou o tri-campeonato mundial de futebol, apresentando uma seleção tida como uma das melhores da história, com Pelé, Tostão, Gerson, Rivelino etc. As pessoas que ou militavam ou simplesmente eram contrárias a ditadura falavam que torcer para o Brasil em gramados mexicanos era colaborar com os militares, contribuindo ideologicamente com o governo repressor e de direita no Brasil. Eu, que comecei a militar na política em meados da década de 1980, que já era fanático por futebol, que tive o prazer e a dor de ver a seleção brasileira na copa da Espanha em 1982 (a melhor seleção brasileira que eu vi jogar), por vezes me vi impelido a controlar minhas pulsões futebolísticas e condenar o campeonato mundial conseguido no México, porque, para muitos companheiros de luta, vibrar com os lances reprisados na TV (inesquecíveis) da final contra a Itália, era deixar de ser de esquerda e, por consequência, se tornar alienado. Confesso que tive crises internas, mas, ao final de contas, consegui separar as coisas em meu coração e mente e assumi meu gosto futebolístico, especialmente pela seleção brasileira, a qual sempre me inspirou um nacionalismo que eu gosto de cultivar, sem perder o senso crítico.
Mas, a questão que quero refletir aqui é sobre uma fratura social que, na minha opinião, a discórdia sobre a realização da copa representa para nós brasileiros. O Brasil, como muitos autores já descreveram, não tem um espírito nacionalista, como vemos, por exemplo, no EUA e no México (me lembro que quando passei o ano novo no México uma vez, em que meus cunhados convidaram amigos mexicanos para a festa em sua casa, as rádios tocaram o hino nacional mexicano à meia-noite). Aqui, talvez porque nossa nacionalidade foi resultado de articulações e ações de uma elite e nunca do povo em geral, como a Independência e a República, talvez por que nossas revoluções foram de cima para baixo e não o contrário, não desenvolvemos um espírito nacionalista, ao contrário, no geral o que percebo é uma certa vergonha de ser brasileiro. O futebol talvez tenha sido, desde a segunda metade do século XX, uma das únicas instituições que unia as pessoas em torno de um sentimento nacional (Airton Senna foi, com certeza, uma excessão à regra, pois nos sentíamos orgulhosos com as vitórias e demonstrações de nacionalidade típicos dele). Bem ou mal, o futebol fazia este papel, de união das pessoas, em determinados momentos, para além das divisões políticas, sociais e econômicas.
Paro por aqui hoje pois é apenas um início de uma reflexão. Além do mais, como algumas pessoas me recomendaram, quando criei meu blog, que as postagens não deveriam ser longas, o que procuro sempre seguir.
Olá Célio,
ResponderExcluirAcho que o que acontece hoje no Brasil é muito diferente do que ocorreu em 1970. Célio, é incomparável o que se vive hoje e o que se vivia então! Era uma ditadura. Por mais que você tenha ressalvas sobre o governo atual, nem tem termos de comparação com o que acontecia em 1970. Somos historiadores, sabemos definir muito bem conjunturas históricas. Acho que temos uma obrigação de ofício de não fazer este tipo de generalização superficial na qual a mídia vem apostando!
Célia, minha comparação é com o clima de anti-copa que se vive no Brasil hoje. Nada tem a ver com comparar governos completamente diferentes. Se dei esta impressão foi mal de minha parte. O que quero enfatizar é que há um clima de crítica à copa do mundo como na década de 70 se criticava a seleção brasileira como atrelada a ditadura. O que me preocupa, na verdade, é a extensão das críticas e o que isto significa em termos de fissura social, o que pretendo tratar nos próximos posts.
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